segunda-feira, 15 de novembro de 2010

UTOPIA

Entendo que qualquer projeto político possui algum teor utópico. Melhor, projetos políticos os mais diversos estão carregados de ideais utópicos. Entre esses ideais podemos citar: a busca pela liberdade, a busca pela igualdade, a busca pela justiça, a busca pelo bem estar social, ou, o mais genérico, a busca por uma sociedade melhor. SIR THOMAS MORE, por exemplo, acreditava que um projeto político decente deveria colocar o bem público acima dos interesses pessoais; a maior parte das sociedades liberais tem como meta estabelecer uma sociedade livre; na Europa Ocidental, a partir dos anos 60 do século XX, predominou a busca pelo estado de bem estar social; mesmo um sistema político autoritário, como o nazismo alemão, tinha por base vários ideais utópicos, como, por exemplo, a busca de determinado tipo de vida que encontrava raízes no passado germânico. Atualmente, no Brasil, a busca pelo fim da desigualdade social pode ser considerado um ideal utópico.
Todavia, apesar de ideais utópicos estarem na base dum projeto político qualquer, o termo "utopia" tem sido constantemente evitado. Isso se deve basicamente a dois fatores:

1) O termo "utopia" (utopia = lugar nenhum) ganhou ao longo dos séculos uma conotação negativa. Hoje, quando se diz que o "o projeto X é utópico", isso quer dizer que o projeto X é fantasioso, não está amarrado com a realidade, ou é um projeto muito ingênuo, beirando a estupidez.

2) Ideais políticos, mesmo os mais legítimos são, na sua maior parte, realmente inalcançáveis e, nesse sentido, utópicos. Todo projeto político envolve valores conflitantes já no seu nascedouro. Assim, a busca por um ideal político afeta muitos interesses; nem sempre, todos os grupos sociais buscam os mesmos ideais, o que solapa qualquer projeto de uma sociedade totalmente harmônica. Também, talvez vários ideais políticos esbarrem na sua impraticabilidade, quando os almejamos de maneira absoluta, pois os interesses humanos são muitos, tendem a "querer tudo" e são limitados por fatores externos, como os interesses das outras pessoas, os interesses das outras noções e as condições naturais.

Temos, assim, um certo paradoxo nos diversos projetos políticos: de um lado, se aceita ideais utópicos como base de projetos políticos mais amplos; de outro lado, se reconhece que certos ideais utópicos são impossíveis de serem realizados nesse mundo, se almejamos valores como a igualdade, a liberdade, a justiça ou o bem estar social de modo absoluto.
Deveríamos então pensar numa nova maneira de encarar o papel da utopia. Ainda mais num mundo plural e instável que acontecemos de estar.


O objetivo do artigo "O papel da utopia", escrito em 2006, é tentar estabelecer uma nova maneira de se perceber ideais utópicos a partir do pluralismo de valores.